Saturday, May 15, 2010

Diz o fatalista...

A tragédia do ocidente é esta: o passado vence sempre. O romantismo, o individualismo, o existencialismo, o transcendentalismo criam novos jogos mentais que não estão safos de cair nas malhas do sentimento de culpa judeo-cristão. O conceito de dívida, sempre à procura de um objecto para agarrar, está entranhado em qualquer consciência social. Sem o sentimento de culpa e seu consequente auto-questionamento de direitos, não se dissolverá a própria sociedade que se quer preservar?

Wednesday, April 14, 2010

Et voilá

Religion, n. A daughter of Hope and Fear, explaining to Ignorance the nature of the Unknowable.

Devil´s Dictionary, Ambrose Bierce

Tuesday, April 6, 2010

Nova fase

Assim como apreciar as raparigas na praia pode beneficiar de algum silêncio sobre o assunto ou da invenção de outros assuntos sobre a vida que encubram a indelicada constatação de que o sexo é tudo, também ler Nietzsche pode ser demasiado desmascarador da vida e, como tal, concluí que ele deve-se ler às escondidas e talvez seja boa ideia não revelar que se o lê, mantendo-o até afastado do quotidiano. Talvez não se se deva perder a máscara correspondente ás expectativas dos outros e deixar as nossas avaliações íntimas ao encargo do nosso subconsciente (ou pré-consciente na linguagem freudiana). Provavelmente este saberá melhor lidar com avaliações socialmente pouco "práticas" que a nossa consciência. Caso contrário, talvez nos arrisquemos a desvitalizar a nossa vida social, assim como a uma flor arrancada do solo que mostra a raiz que a natureza não nos prescrevia olhar.

Saturday, April 3, 2010

Mais um mito...

...Nietzsche não rejeita o iluminismo. Apenas lhe retira o carácter transcendente. A razão é humana e não universal. Ela não se refere ao mundo exterior mas ao mundo criado pela linguagem humana:

"A importância da linguagem para o desenvolvimento da cultura está em que nela o homem estabeleceu um mundo próprio ao lado do outro, um lugar que se considerou firme o bastante para, a partir dele, tirar dos eixos o mundo restante e se tornar seu senhor. Na medida em que por muito tempo acreditou nos conceitos e nomes das coisas como em aeternae veritates [verdades eternas], o homem adquiriu esse orgulho como que se erguendo acima do animal: pensou ter realmente na linguagem o conhecimento do mundo. O criador da linguagem não foi modesto a ponto de crer que dava às coisas apenas denominações, ele imaginou, isto sim, exprimir com as palavras o supremo saber sobre as coisas; de fato, a linguagem é a primeira etapa no esforço da ciência. Da crença na verdade encontrada , fluíram, aqui também, as mais poderosas fontes de energia. Muito depois – somente agora – os homens começam a ver que, em sua crença na linguagem, propagaram um erro monstruoso. Felizmente é tarde demais para que isso faça recuar o desenvolvimento da razão, que repousa nessa crença."

Humano, demasiado Humano

E ele não era um romântico subjectivista em relação à arte:

"[...] a improvisação artística encontra-se muito abaixo do pensamento artístico seleccionado com seriedade e empenho. Todos os grandes [artistas] foram grandes trabalhadores, incansáveis não apenas no inventar, mas também no rejeitar, eleger, remodelar e ordenar."

Humano, demasiado Humano

Nietzsche chega ao ponto de enfatizar a importância da razão na arte, de forma a que chegue aos interlocutores. Tudo ao contrário do que os atrasados mentais dos supostos seus seguidores pós-modernistas interpretam dele.

E por último:

Existe uma ideia falsa de que Nietzsche considera que o ser superior deve seguir os seus instintos sem complacência. Não passou pela cabeça de ninguém que o problema que ele coloca não é o da obediência aos desejos mas simplesmente, de se permitir que eles existam.

À pergunta "o que confere nobreza?", uma das respostas de Nietzsche é: "[...] não será obedecer às paixões: há paixões desprezíveis." Logo em seguida, diz ele que "[...] a paixão que se apodera do ser nobre é coisa que ele não se dá conta [...]."

Humano, demasiado Humano

Para que se entenda melhor, um excerto do mestre em teoria literária Vítor Henriques:

"Há, portanto, uma razão que ao mesmo tempo molda e entende a vida e desaparece perante o assalto das paixões sem se dar conta disso; é nesse sentido que entendemos a razão em Nietzsche como uma razão trágica, já que se impõe e se esvai, como se ela afirmasse e fosse negada ao mesmo tempo. Trágica, porque essa dubiedade é tão fatal como a dor é para a vida. A obstrução da dor é a obstrução da própria alegria, já que para Nietzsche quanto mais feliz é um homem, mas infeliz ele pode ser, pois mais susceptível às afectações do mundo. Para o filósofo, quanto maior o desprazer, maior foi o prazer. Assim sendo, da mesma maneira que alegria e dor são um e o mesmo, razão e desrazão se entrelaçam num mundo tragicamente concebido."

Friday, April 2, 2010

Mais um exemplo...

...de como vale a pena ler outras pessoas. Muitas delas entendem-nos melhor do que nós proprios e dizem numa frase aquilo que pensamos em milhares de ideias falhadas:

"The violence of Cioran's work, its verbosity and arrogance, results from a struggle with inevitable positivism.The use of aphorism is also borne of this. It demands our opposition. The blank following the sentences rises up before us. Our exasperation leaves the same silent space hovering there. This is the placeless heaven or hell Cioran is always returning us to. It is pointless to oppose or argue - or explain. One can scan the biographical parabola that gives shape to a life, thereby explaining it and the work, but something is left behind; this place he takes us to. The facts of a life help inasmuch as noise masks silence. But something is left behind. Generally, it seems students study, reviewers review, writers write and readers read in the hope of avoiding this. It's what the people want, after all."

Tuesday, March 30, 2010

Cinismo oculto

A propósito do Protágoras de Platão:

"Protagoras, famous for his claim that man is the measure of all things, is widely regarded as the world's first relativist and anti-foundational thinker. We learn from Plato that Protagoras also greatly admired the virtue of courage, as have later anti-foundational thinkers like Nietzsche and Heidegger. The connection between anti-foundationalism and admiration for courage seems obvious at first: to know that we cannot know the truth is a hard truth to bear and therefore requires courage or fortitude in the knower if he is to accept this truth, and if he is still to have the courage of his convictions, no matter how unfounded. Yet Plato's examination of Protagoras and his thought suggests another and unexpected relationship between Protagoras' anti-foundationalism and his admiration for courage. Plato suggests that Protagoras does not, in fact, respect courage because he is an anti-foundationalist, but rather is an anti-foundationalist because he so deeply admires the virtue of courage. Protagoras longs for a world in which great courage is both possible and necessary. The belief that we cannot know the truth, and that all of our decisions therefore involve considerable risk, makes for such a world. Therefore Protagoras subscribes to this belief and is an anti-foundationalist. His anti-foundationalism is born more of moral hope than of a clear-sighted assessment of reality, or so Plato
suggests. In my paper, I explore this intriguing Platonic assesment of Protagorean relativism and suggest that it may also apply to later anti-foundational thinkers, such as Nietzsche and Heidegger."

Mas neste caso não será o estabelecimento da ideia de que existe uma verdade, um bem absoluto, um serviço que se presta aos indecisos e desorientados de uma comunidade ou até mesmo aos predominantemente corajosos que passam por uma fase de hesitação? Platão não admitirá, implicitamente, que essa fé é o desejo de salvação daqueles que não conseguem viver com incertezas na vida? O cinismo político está ali implícito, embora ele não o queira admitir. Ele tem medo que uma civilização decline porque, no fundo, não acredita que a maioria das pessoas tenha coragem de viver na incerteza sem se desmotivar de trabalhar e lutar pela sua comunidade porque ele próprio não encontra, como nunca ninguém encontrou, argumento definitivo que motive as pessoas para tal.

Thursday, March 25, 2010

Jean-Jacques Rousseau e Friedrich Nietzsche em defesa da liberdade

por Rafael Teixeira –

ÍNDICE:

* 1. Introdução
* 2. A questão da piedade
* 3. O interesse pelo bem-estar e a vontade-de-potência
* 4. A propriedade e a vontade-de-verdade
* 5. O entregar-se unicamente ao sentimento da existência atual e o eterno retorno
* 6. Jean-Jacques Rousseau e Friedrich Nietzsche em defesa da liberdade
* 7. Bibliografia

1. INTRODUÇÃO

“… são, todos, indícios funestos de que a maioria de nossos males é obra nossa e teríamos evitado quase todos se tivéssemos conservado a maneira simples, uniforme e solitária de viver prescrita pela natureza.”
(Jean-Jacques Rousseau, Discurso sobre a desigualdade)

“Tenho como fórmula um princípio. Todo naturalismo na moral, isto é, toda sã moral, está dominada pelo instinto da vida; [...] A moral antinatural, isto é, toda moral ensinada, venerada e predicada até agora, se dirige, ao contrário, contra os instintos vitais e é uma condenação já secreta, já ruidosa e descarada desses instintos.”
(Friedrich Nietzsche, Crepúsculo dos ídolos)

O presente trabalho é certamente audacioso. Aproximar dois filósofos controversos e de discursos aparentemente distintos e desconexos, não pode ser considerado tarefa de pouco esforço. E, com efeito, não é.

Dentre muitas questões prévias, uma suscita particular interesse e prescreve sua resposta de antemão: com que finalidade estabelecemos paralelos entre discursos? É isso, somente, uma despretensiosa distração intelectual ou um real e proveitoso empreendimento? Não iremos tão longe. Por hora, basta que limitemos a questão ao caráter peculiar dos discursos filosóficos (e especialmente dos discursos aqui tratados) e encontraremos sua possível resposta em uma outra questão, retórica: podem filósofos livres e condizentes com a seriedade e especificidade da interrogação filosófica, afirmar quase o oposto a respeito de uma mesma realidade?

O ingênuo ou tendencioso julgo da tradição nos leva a crer que sim. Mas, já aqui, indico um ponto em comum entre Jean-Jacques Rousseau e Friedrich Nietzsche: a disposição quase imperativa em romper com a tradição.

2. A QUESTÃO DA PIEDADE

“… enquanto resistir ao impulso interior natural da comiseração, jamais fará qualquer mal a um outro homem, nem mesmo a um ser sensível, exceto no caso legítimo em que, encontrando-se em jogo sua conservação, é obrigado a dar preferência a si mesmo.”
(Jean-Jacques Rousseau, discurso sobre a desigualdade)
“E por isso o homem nobre impõe a si mesmo o dever de não envergonhar; quer ter recato perante todo o que sofre. Em verdade, não me agradam os misericordiosos, os que se comprazem na sua piedade; são demasiado faltos de pudor…”
(Friedrich Nietzsche, Assim falava Zaratustra)

Proponho aqui, uma elucidação da questão que é geralmente apontada como a principal divergência entre os dois filósofos: a questão da piedade.

De acordo com o discurso sobre a origem e os fundamentos da desigualdade entre os homens, de Rousseau, a repugnância natural por ver perecer ou sofrer qualquer ser sensível e principalmente nossos semelhantes é um princípio da alma humana anterior à razão (o homem é, portanto, naturalmente piedoso). Nietzsche, em uma primeira e descuidada análise, afirma exatamente o oposto: a piedade é um valor inferior, um valor de escravos, contrário e até mesmo hostil aos instintos vitais. Estarão eles falando de uma mesma “piedade”?

É certo que não. Essa apressada contraposição entre os dois discursos se deve, muito provavelmente, a uma falta de clareza entre o que Rousseau atribui ao homem em seu estado de natureza, e o que Nietzsche aponta como sendo nocivo ao homem de rebanho (ao homem em seu estado civil). A piedade não pode nunca coagir em detrimento do instinto de conservação da vida no estado de natureza; a piedade, tal como Rousseau a emprega, não tem o caráter de um ato, muito menos de um dever ético: é tão somente a qualidade de não causar um dano inutilmente a um outrém, principalmente aos nossos semelhantes. É também uma objeção a representação defendida, entre muitos outros, pelo inglês Thomas Hobbes (o homem é o lobo do próprio homem quando encontra-se em seu estado primitivo): o desconhecimento da bondade não implica necessariamente na realização da maldade.

Do mesmo modo, Nietzsche condena a moral de ressentimento, de escravos, vingativa, que diz Não a um “fora”, a um “outro”, a um “não-eu”. O homem é, segundo o filósofo alemão, uma ponte para o super-homem. Deve, portanto, superar a si mesmo, e não necessariamente a um outrém.

Fica patente, portanto, que não há graves divergências entre os dois pensadores no que diz respeito a questão da piedade. Podemos prosseguir.

3. O INTERESSE PELO BEM-ESTAR E A VONTADE-DE-POTÊNCIA

“… alma humana, creio nela perceber dois princípios anteriores à razão, um dos quais interessa profundamente ao nosso bem-estar e à nossa conservação.”
(Jean-Jacques Rousseau, Discurso sobre a desigualdade)

“O que é bom? – Tudo aquilo que desperta no homem o sentimento de poder, a vontade de poder, o próprio poder. O que é mal? – Tudo o que nasce da fraqueza. O que é a felicidade? – A sensação de que o poder cresce, de que uma resistência foi vencida.”
(Friedrich Nietzsche, O Anticristo)

“Em cada animal vejo somente uma máquina engenhosa a que a natureza conferiu sentidos para recompor-se por si mesma e para defender-se, até certo ponto, de tudo quanto tende a destruí-la ou estragá-la. Percebo as mesmas coisas na máquina humana, com a diferença de tudo fazer sozinha a natureza nas operações do animal, enquanto o homem executa as suas como agente livre.” Cabe-nos aqui, analisar o argumento acima, retirado do discurso sobre a desigualdade, de Rousseau, e estabelecer uma relação com a concepção de vontade-de-potência em Nietzsche.

Não incidiremos aqui em um erro muito comum presente em diversas interpretações da obra de Nietzsche: reduzir a significação de vontade-de-potência a uma pré-ocupação com a conservação da vida. A significação de vontade-de-potência é certamente muito maior.

Neste ponto, exponho a principal divergência (essa sim, uma real divergência) entre os dois pensadores: a faculdade do homem de aperfeiçoar-se. Mas é essa divergência, ao mesmo tempo, um importante ponto em comum: ambos reconhecem no homem a liberdade e a capacidade de criação, de aperfeiçoar-se. O desacordo está, pois, não nas faculdades que são admitidas em ambos os discursos como constitutivas da natureza humana, e sim no valor que é atribuído a cada uma delas.

No discurso sobre a desigualdade, a faculdade do homem de aperfeiçoar-se, distintiva e quase ilimitada, é indicada como a fonte de todos os males. É o desenvolvimento das paixões e das indústrias da “máquina humana” que estabelece uma relação de dependência com o mundo e desvia-a de suas necessidades naturais. Em oposição, o filósofo alemão reconhece na capacidade de auto-superação o princípio fundamental do homem e o destino de sua existência como realização de sua vontade-de-potência. O homem é um meio. É preciso, portanto, que seja superado, que se sobreponha a suas fraquezas, em busca de seu fim: o super-homem.

De qualquer modo, fica implícita a interrogação da qual nos ocuparemos daqui em diante, até o final deste trabalho: é o homem no estado de natureza, interessado somente pelo seu bem-estar e pela sua conservação, tal como Jean-Jacques Rousseau o descreve em seu discurso sobre a origem e os fundamentos da desigualdade, mais próximo de se tornar um além-do-homem? Soube a espécie humana, no decorrer de sua existência, fazer bom uso dessa faculdade de aperfeiçoar-se, dessa sua capacidade de criação? Eis aqui uma questão que suscita muitas outras. Mas não convém, aqui, irmos tão longe.

“… e logo reconhecereis qual a vantagem de sempre ter todas as forças à sua disposição, de sempre estar pronto para qualquer eventualidade e de transportar-se, por assim dizer, sempre todo inteiro consigo mesmo.” Destacamos aqui uma qualidade comum ao homem em estado de natureza e ao super-homem idealizado por Nietzsche: a obediência única aos seus instintos e, portanto, a ausência de qualquer sujeição a um outrém.

Não nos cabe aqui, examinar se é o homem que obedece somente a si mesmo inteiramente livre ou não. É suficiente que se torne explícita a condição de dependência a qual o homem é levado quando é submetido a moral de rebanho, quando é, por fim, domesticado (os dois autores empregam este termo). É natural que a sociedade (não entenda-se aqui sociedade no sentido lato da palavra) seja hostil aos instintos vitais e até mesmo a conservação da espécie humana. É natural que a sociedade seja hostil ao próprio homem.

4. A PROPRIEDADE E A VONTADE-DE-VERDADE

“… pode-se imaginar como escaparam a homens que só julgavam as coisas pelo primeiro aspecto. [...] Como teriam podido, por exemplo, imaginar ou compreender as palavras matéria, espírito, substância, moda, figura, movimento,umas vez que [...] as idéias relativas a tais palavras, sendo puramente metafísicas, não se poderiam encontrar delas qualquer modelo na natureza? ”
(Jean-Jacques Rousseau, Discurso sobre a desigualdade)

“’O mundo-verdade e o mundo-aparência’ – essa antinomia é reconduzida por mim a relações de valores. Projetamos nossas condições de conservação como atributos de ser em geral. O fato de que, para prosperar, impõe-se a estabilidade em nossa crença, levou-nos a afirmar que o ‘mundo-verdade’não é mutável e flutuante no devir, mas que ele é o ser.”
(Friedrich Nietzsche, Vontade de potência)

Arriscaremos, de início, uma afirmação: O homem no estado de natureza não tem vontade-de-verdade. Mas o que é a vontade-de-verdade? O que no homem sente vontade-de-verdade? Respondo: tudo o que foge ao que há de mais natural, tudo o que é contrário ao devir que constitui a nossa existência. A vontade-de-verdade é a objeção do homem à sua própria natureza.

Naturalmente, o homem no estado de natureza não tem vontade-de-verdade. A verdade ainda não ganhou substancialidade, não é entendida como coisa-em-si. É, pois, tudo o que aparece, tudo o que se mostra, tudo o que é aspecto. O engodo da substância, da coisa-em-si, ainda não o iludiu. O homem no estado de natureza sabia viver.

Em que momento de sua existência o homem conspirou insidiosamente contra sua natureza? Em que momento, segundo as palavras de Jean-Jacques Rousseau, foi comprada uma “tranquilidade imaginária pelo preço de uma felicidade real”? No momento em que o homem deixou de ser homem. No momento em que sentiu-se fraco e vulnerável, disse não a si mesmo e à sua natureza e, ressentido, amaldiçoou o devir e excogitou: “Isso é!” Nascia, assim, a vontade-de-verdade como uma pretensa posse de toda a realidade. Nascia a propriedade como realização de uma vontade-de-verdade.

5. O ENTREGAR-SE UNICAMENTE AO SENTIMENTO DA EXISTÊNCIA ATUAL E O ETERNO RETORNO

“Sua alma, que nada agita, entrega-se unicamente ao sentimento da existência atual sem qualquer idéia do futuro, ainda que próximo, e seus projetos, limitados como suas vistas, dificilmente se estendem até o fim do dia.”
(Jean-Jacques Rousseau, Discurso sobre a desigualdade)

“E se um dia ou uma noite um demônio se esgueirasse em tua mais solitária solidão e te dissesse: ‘Esta vida, assim como tu a vives agora e como a viveste, terás de vivê-la ainda uma vez e ainda inúmeras vezes; e não haverá nela nada de novo, cada dor e cada prazer e cada pensamento e suspiro e tudo o que há de indizivelmente pequeno e de grande em tua vida há de retornar, e tudo na mesma ordem e sequência’ – [...] Não te lançarias ao chão e rangerias os dentes e amaldiçoarias o demônio que te falasse assim? Ou viveste alguma vez um instante descomunal em que lhe responderias: ‘Tu és um deus, e nunca ouvi nada mais divino!’”
(Friedrich Nietzsche, A gaia ciência)

Retomaremos a questão que, aparentemente, foi esquecida em “O interesse pelo bem-estar e a vontade-de-potência”: é o homem no estado de natureza, interessado somente pelo seu bem-estar e pela sua conservação, tal como Jean-Jacques Rousseau o descreve em seu discurso sobre a origem e os fundamentos da desigualdade, mais próximo de se tornar um além-do-homem? Soube a espécie humana, no decorrer de sua existência, fazer bom uso dessa faculdade de aperfeiçoar-se, dessa sua capacidade de criação?

Com efeito, a questão não foi esquecida e nem colocada em segundo plano. Estamos a caminho de sua resposta. No entanto, resta ainda uma última e fundamental questão: o tempo como propriedade.

O homem em estado de natureza, idealizado por Rousseau, não possui previdência, entrega-se unicamente ao sentimento da existência atual. É o exemplo do Caraíba, que “de manhã vende o colchão de algodão e de tarde chora, querendo readquiri-lo, por não ter previsto que na noite seguinte necessitaria dele.”

Somente com a negação à vida e com a vontade de se instituir posse de toda a realidade, o tempo foi substancializado e suposto como propriedade do homem. Antes disso, fazendo uso das palavras do filósofo de Genebra, “sua imaginação nada lhe descreve, o coração nada lhe pede.” A espécie humana encontrava tudo o que suas necessidades lhes prescrevia.

O mito do eterno retorno é a fórmula de aceitação incondicional à vida, é a fórmula que elimina o “não à vida” e impõe que cada instante seja vivido, afirmado como único, do mesmo modo que fazia o “homem primitivo”.

O homem em estado de natureza está sendo. Não se ilude que foi, que será ou que possa ser. Que infeliz acaso levou o homem a cultivar esperanças por um futuro incerto e ressentimentos por um passado que não mais existe? No momento em que o homem amaldiçoou o devir e excogitou “isso é!”, amaldiçoou também sua existência e a de toda a espécie humana. Julgou-se liberto de sua natureza, mas, no entanto, só encontrava grilhões.

É possível que já tenhamos o suficiente para que arrisquemos uma provisória resposta à nossa questão. Com efeito, não será essa uma decisiva resposta: o desenvolvimento de nossa interrogação já alcançou o ponto em que a resposta é quase uma inconveniencia, uma estupidez. Talvez já nem mesmo a nossa questão tenha tanto sentido quanto antes. Em todo caso, alguma coisa ainda tem vontade-de-verdade.

6. JEAN-JACQUES ROUSSEAU E FRIEDRICH NIETZSCHE EM DEFESA DA LIBERDADE

“O cidadão, ao contrário, sempre ativo, cansa-se, agita-se, atormenta-se sem cessar para encontrar ocupações ainda mais trabalhosas; trabalha até a morte, corre no seu encalço para colocar-se em situação de viver ou renunciar à vida para adquirir a imortalidade; corteja os grandes, que odeia, e os ricos, que despreza; nada poupa para obter a honra de servi-los; jacta-se orgulhosamente de sua própria baixeza e da proteção deles, e, orgulhoso de sua escravidão, refere-se com desprezo àqueles que não gozam a honra de partilhá-la.”
(Jean-Jacques Rousseau, Discurso sobre a desigualdade)

“Eu vos apresento o Super-homem! O Super-homem é o sentido da terra. Diga a vossa vontade: seja o Super-homem, o sentido da terra. Exorto-vos, meus irmãos, a permanecer fiéis à terra e a não acreditar em que vos fala de esperanças supraterrestres. São envenenadores, quer o saibam ou não. Não dão o menor valor à vida, moribundos que estão, por sua vez envenenados, seres de que a terra se encontra fatigada; vão se por uma vez!”
(Friedrich Nietzsche, Assim falava Zaratustra)

Retomo então, novamente, à questão que aqui vem sendo discutida, desta vez com o intuito de concluir o presente trabalho com sua provisória resposta: é o homem no estado de natureza, interessado somente pelo seu bem-estar e pela sua conservação, tal como Jean-Jacques Rousseau o descreve em seu discurso sobre a origem e os fundamentos da desigualdade, mais próximo de se tornar um além-do-homem? Soube a espécie humana, no decorrer de sua existência, fazer bom uso dessa faculdade de aperfeiçoar-se, dessa sua capacidade de criação?

O homem, a patir do momento em que deixou de ser homem, só encontrou (criou) grilhões. Decidiu-se pelo caminho da tranquilidade imaginária e do ilusório “cerco” à natureza (entendida aqui como “physis”), estabelecendo uma relação de posse, de propriedade com o devir, mesmo que, para isso, fosse preciso enganar-se e renegar sua real liberdade. Esqueceu-se de que é ele também natureza, physis, e tornou-se posse de suas abstrações.

Em oposição, o homem em seu estado de natureza ainda não foi submetido a engodos e é, pois, livre para superar-se em busca não de um erro, de uma quimera, mas do além-do-homem, do homem que diz sim à cada instante de sua vida e entrega-se unicamente ao sentimento da existência atual. É preciso “aprender” com o homem primitivo, com o real e único homem. O homem no estado de natureza sabe viver.

Jean-Jacques Rousseau e Friedrich Nietzsche, concluímos, não afirmavam o oposto e nem tinham discursos tão distantes quanto se imagina. Quando se estabelece um paralelo entre os dois filósofos, desvela-se pelo menos um fundamental ponto em comum: o amor à liberdade (à natureza) que impõe a necessidade de se romper com a tradição (grilhões).

“Por que fitas-me assim, oh! caveira incolor?
Teu cérebro, qual meu, outrora divagava,
Buscando a luz do dia e da aurora o esplendor
E almejando a Verdade, em erros mergulhava!
Até vós, instrumentos, escarneceis agora,
Campânulas, cilindros, rodas e retorta.
Eu a entrada a forçar, vós sois a chave, embora,
Que ao trinco não se ajusta e nunca abre a porta.
Coberta de mistério, assim, em plena luz,
A Natura não tira os seus véus nevoentos.
Se nunca revelou o que a alma seduz,
Arrancar-lhe não podes com tais instrumentos.”

(Johann Goethe, Fausto)

7. BIBLIOGRAFIA:

ROUSSEAU, Jean-Jacques, <>Discurso sobre a origem e os fundamentos da desigualdade entre os homens. São Paulo, Ed. Nova Cultural, 1999;
NIETZSCHE, Friedrich, Assim falava Zaratustra, Tradução de Mário da Silva. Rio de Janeiro, Ed. Civilização Brasileira, 1981;
NIETZSCHE, Friedrich, Vontade de potência, Tradução de Mário D. Ferreira Santos. Rio de Janeiro, Ed. Ediouro, 1988;
NIETZSCHE, Friedrich, Crepúsculo dos Ídolos, Tradução de Edson Bini e Márcio Pugliesi. Rio de Janeiro, Ed. Ediouro, 1988;
NIETZSCHE, Friedrich, O anticristo, Tradução de Pietro Nassetti. São Paulo, Ed. Martin Claret, 2003;

Thursday, March 11, 2010

Smooth Operators

Nietzsche:

"Eu li a Bíblia de capa a capa. Chamar aquele livro de ‘a palavra de Deus’ é um insulto a Deus. Chamar aquele livro de um guia moral é uma afronta à decência e dignidade dos povos. Chamá-lo de guia para a vida é fazer uma piada de nossa existência. E pretender que ela seja a verdade absoluta é ridicularizar e subestimar o intelecto humano"

“Má compreensão do sonho. – Nas épocas de cultura tosca e primordial o homem acreditava no sonho conhecer um segundo mundo real; eis a origem de toda metafísica. Sem o sonho, não teríamos achado motivo para uma divisão do mundo. Também a decomposição em corpo e alma se relaciona à antiqüíssima concepção do sonho, e igualmente a suposição de um simulacro corporal da alma, portanto a origem de toda crença nos espírito e também, provavelmente, da crença nos deuses: ‘Os mortos continuam vivendo, porque aparecem em sonho aos vivos’: assim se raciocinava outrora, durante muitos milênios"

"Somente uma coisa é necessária’... Que todo homem, por possuir uma ‘alma imortal’, tenha tanto valor quanto qualquer outro homem; que na totalidade dos seres a ‘salvação’ de todo indivíduo um possa reivindicar uma importância eterna; que beatos insignificantes e desequilibrados possam imaginar que as leis da natureza são constantemente transgredidas em seu favor – não há como expressar desprezo suficiente por tamanha intensificação de toda espécie de egoísmos ad infinitum, até a insolência. E, contudo, o cristianismo deve o seu triunfo precisamente a essa deplorável bajulação de vaidade pessoal – foi assim que seduziu ao seu lado todos os malogrados, os insatisfeitos, os vencidos, todo o refugo e vômito da humanidade. A ‘salvação da alma’ – em outras palavras: ‘o mundo gira ao meu redor’..."


"Se o cristianismo tivesse razão em suas teses acerca de um Deus vingador, da pecaminosidade universal, da predestinação e do perigo de uma danação eterna, seria um indício de imbecilidade e falta de caráter não se tornar padre, apóstolo ou eremita e trabalhar, com temor e tremor, unicamente pela própria salvação; pois seria absurdo perder assim o benefício eterno, em troca da comodidade temporal. Supondo que se creia realmente nessas coisas, o cristão comum é uma figura deplorável, um ser que não sabe contar até três, e que, justamente por sua incapacidade mental, não mereceria ser punido tão duramente quanto promete o cristianismo"

Sebastian Fauré:

"Foste vós que, primeiramente, afirmastes a existência de Deus; deveis, pois, ser os primeiros a pôr de parte vossas afirmações. Sonharia eu, alguma vez, com negar a existência de Deus, se vós não tivésseis começado a afirmá-la? E se, quando eu era criança, não me tivessem imposto a necessidade de acreditar nele? E se, quando adulto, não tivesse ouvido afirmações nesse sentido? E se, quando homem, os meus olhos não tivessem constantemente contemplado os templos elevados a esse Deus? Foram as vossas afirmações que provocaram as minhas negações. Cessai de afirmar que eu cessarei de negar".
(esta é a minha preferida pois é a melhor maneira de explicar porque sou ateu)

Freud:

"A humanização da natureza deriva da necessidade de pôr fim à perplexidade e ao desamparo do homem frente a suas forças temíveis, de entrar em relação com elas e, finalmente, de influenciá-las. (...) O homem primitivo não tem escolha, não dispõe de outra maneira de pensar. É-lhe natural, algo inato, por assim dizer, projectar exteriormente sua existência para o mundo e encarar todo acontecimento que observa como manifestação de seres que, no fundo, são semelhantes a ele próprio"

"... [a religião é] um sistema de doutrinas e promessas que, por um lado, lhe explicam os enigmas deste mundo com perfeição invejável e que, por outro lado, lhe garantem que uma Providência cuidadosa velará por sua vida e o compensará, numa existência futura, de quaisquer frustrações que tenha experimentado aqui. O homem comum só pode imaginar essa Providência sob a figura de um pai ilimitadamente engrandecido. Apenas um ser desse tipo pode compreender as necessidades dos filhos dos homens, enternecer-se com suas preces e aplacar-se com os sinais de seu remorso. Tudo é tão patentemente infantil, tão estranho à realidade, que, para qualquer pessoa que manifeste uma atitude amistosa em relação à humanidade, é penoso pensar que a grande maioria dos mortais nunca será capaz de superar essa visão da vida. Mais humilhante ainda é descobrir como é vasto o número de pessoas de hoje que não podem deixar de perceber que essa religião é insustentável e, não obstante isso, tentam defendê-la, item por item, numa série de lamentáveis actos retrógrados"

"Os que não padecem desta neurose (religiosidade) talvez não precisem de intoxicante para amortecê-la. Encontrar-se-ão, é verdade, numa situação difícil. Terão de admitir para si mesmos toda a extensão de seu desamparo e insignificância na maquinaria do universo; não podem mais ser o centro da criação, o objeto de eterno cuidado de uma Providência beneficente. Estarão na mesma posição de uma criança que abandonou a casa paterna, onde se achava tão bem instalada e tão confortável. Mas não há dúvidas que o infantilismo está destinado a ser superado. Os homens não podem permanecer crianças para sempre; têm de, por fim, sair para a vida ‘hostil’"
(uma forma mais suave de perceber a exaltação da "Guerra" do Zaratrustra de Nietzsche)

E agora, Voltaire, um deísta:

"[Christianity] is assuredly the most ridiculous, the most absurd and the most bloody religion which has ever infected this world. Your Majesty will do the human race an eternal service by extirpating this infamous superstition, I do not say among the rabble, who are not worthy of being enlightened and who are apt for every yoke; I say among honest people, among men who think, among those who wish to think. … My one regret in dying is that I cannot aid you in this noble enterprise, the finest and most respectable which the human mind can point out."

* Voltaire, Letters of Voltaire and Frederick the Great (New York: Brentano's, 1927), transl. Richard Aldington, letter 156 from Voltaire to Frederick, 5 January 1767.

Saturday, February 13, 2010

Ora bolas!

Agora é que a liberdade de imprensa está mesmo em causa. É melhor pôr isto tudo em pratos limpos senão ainda ficamos, sei lá, na mesma.

Será que os líderes da oposição são todos estúpidos ou são apenas hipócritas armados em santinhos? E o que é que será pior?

Monday, February 1, 2010

Sobre o juízo

"A falsidade de um juízo não pode constituir, em nossa opinião, uma objeção contra esse juízo. Esta poderia ser uma das afirmativas mais surpreendentes de nossa linguagem. A questão é saber em que medida este juízo serve para conservar a espécie, para acelerar, enriquecer e manter a vida. Por princípio estamos dispostos a sustentar que os juízos mais falsos (e entre estes os "juízos sintéticos a priori") são para nós mais indispensáveis, que o homem não poderia viver sem as ficções da lógica, sem relacionar a realidade com a medida do mundo puramente imaginário do incondicionado e sem falsear constantemente o mundo através do número; renunciar aos juízos falsos equivaleria a renunciar à vida, a renegar à vida. Admitir que o não-verdadeiro é a condição da vida, é opor-se com audácia ao sentimento que se tem habitualmente dos valores. Uma filosofia que se permita tal intrepidez se coloca, apenas por este fato, além do bem e do mal."

Para além do Bem e do Mal, Nietzsche

Friday, January 29, 2010

A violência de estar vivo

"Como se enganam aqueles que querem viver "de acordo com a natureza"! Nobres estóicos, que falsas palavras!Com efeito, imaginai um ser moldado pela Natureza, prodigioso à sua imagem, infinitamente indiferente, carente de intenções, e vislumbres de piedade e justiça, fecundo, estéril e incerto, ao mesmo tempo; porém imagina! também o que significa a própria indiferença convertida em poder: poderíeis viver de acordo com essa diferença? Viver é querer ser diferente da Natureza, formar juízos de valor, preferir, ser injusto, limitado, querer ser diferente! Admitindo que o lema "de acordo com a Natureza" signifique no fundo "de acordo com a vida" seria possível que actuásseis de outra forma? Por que então fazer um principio do que já sois, daquilo que podeis deixar de ser? Vede, pois, que em verdade, sucede exactamente o contrário: quando pretendeis desentranhar fervorosamente em a Natureza os preceitos de nossas leis, o que buscais, na realidade, é algo muito distinto do que gostaríeis de encontrar. Os actores de impostura, querendo enganar aos demais, promoveis a vingança de vós mesmos! Vosso orgulho sempre demolidor pretende impor à Natureza vossa moral e vosso ideal. Sim, porque desejais que tudo quanto existe se reduza à vossa própria imagem, fazendo uma prodigiosa e eterna apoteose e uma generalização do estoicismo. Porém, apesar de todo nosso amor pela verdade, vos empenhas em ver a Natureza como ela não é, em vê-la estóica, e finalmente, não podeis vê-la de outro modo. Não sei que orgulho limitado me inspira esta Insensata esperança, posto que, ainda que estando conscientes de que sois vosso próprio tirano, insistis em vosso erro, acreditando, que a Natureza se prestará à tirania, como se o estoicismo não fosse também parte da natureza. Tudo isso, entretanto, é uma velha e eterna história, a filosofia, no fundo da Natureza, e seu contexto visível, é apenas esse instinto tirânico: a vontade de potência em seu aspecto mais intelectual, a vontade de "criar o mundo" e implantar nele a causa primeira."

Para Além do Bem e do Mal, Nietzsche

Tuesday, January 26, 2010

Aprendendo com Hamurabi? 1

Aqui vão alguns exemplos de leis 400 anos mais antigas que Moisés, o Torah e os 10 mandamentos:

3-Se qualquer um intentar uma acusação de qualquer crime ante os anciãos, e não provar que ele a tenha cobrado, deve, se ela for uma ofensa capital, ser codenado à morte.

5-Se um juiz tentar um caso, chegar a uma decisão, e apresentar sua decisão, por escrito e se mais tarde aparecer um erro na sua decisão, e que seja por culpa sua, então ele deverá pagar doze vezes o montante da coima fixado por ele no Caso, e deve ser publicamente removido de juiz da bancada, e nunca mais ele se deve sentar lá para tornar acórdão.

14-Se qualquer um roubar o filho menor de outro, ele deve ser posto à morte

55-Se qualquer um abrir sua valas para a água a sua cultura, mas é negligente, e a água inundar o campo de seu vizinho, então ele deverá pagar o seu vizinho milho por sua perda.

114-Se um homem não tem nenhum crédito sobre um outro para o milho e dinheiro, e tentar procura-lo pela força, ele deverá pagar um terço de uma mina de prata em cada caso.

115-Se alguém tiver pendente o seu pedido de milho ou de dinheiro após a prisão do devedor e esse devedor morrer na prisão uma morte natural, o caso não deve ir mais longe.

128-Se um homem tomar uma mulher para mulher, mas não tem qualquer relação com ela, esta mulher não é mulher para ele.

129-Se um homem apanhar a esposa (em flagrante delito) com outro homem, ambos devem ser amarrados e lançados na água, mas o marido pode perdoar a sua esposa doá-los ao rei como escravos.

130-Se um homem violar a esposa (nubentes ou mulher-criança) de outro homem, que nunca tenha conhecido um homem, e ainda vive na casa do seu pai e dormir com ela e ser surpreendido, este homem será posto à morte, mas a Esposa é inocente.

131-Se um homem levar uma cobrança contra a própria mulher, mas ela não for surpreendida com outro homem, ela deve assumir um juramento e, em seguida, pode retornar para sua casa.

133-Se um homem é levado prisioneiro na guerra, e há um sustento em sua casa, mas sua esposa deixar casa e judicial, e ir para outra casa: porque esta mulher não manter a sua jurisdição, e foi para outra casa, ela deve ser Judicialmente condenada e atirada na água.

135-Se um homem for feitos prisioneiro na guerra e não haja sustento em sua casa e sua esposa for para outra casa e suportar crianças de outro, e se mais tarde o marido retornar e chegar à sua casa: então esta mulher deve retornar para o seu marido, mas a Crianças ficam com seu pai.
(a simplicidade dói)

136-Se qualquer um deixar sua casa, fugir e, em seguida, sua esposa ir para outra casa e ele voltar e pretender levar a esposa de volta: porque ele fugiu de sua casa e correu longe, a esposa deste fugitivo não deve regressar para o seu marido.

137-Se um homem deseja separar de uma mulher que ele tenha suportado os filhos, ou de sua esposa, que ele tem suportado crianças: então, ele dará a sua esposa dote e uma parte do usufruto do campo, jardim e bens, a fim de que ela possa resguardar seus filhos. Uma parte de tudo o que é dado às crianças deve ser dada a ela na mesma quantidade de um filho. Ela pode então casar com o homem de seu coração.

138-Se um homem deseja separar-se de sua mulher não tem a seu cargo filhos, ele deve dar-lhe o montante da sua compra em dinheiro (...)

139-Se não houve preço de compra dirigir-se-á dar-lhe uma mina de ouro como um dom de libertação.
(as mulheres devem estar frustradas de não ter vivido neste tempo)

141-Se um homem pretende deixar a mulher com quem vive e esta mergulha-o em dívidas, tenta arruinar sua casa, desprezando o seu marido e ele estiver condenado judicialmente: se o seu marido oferecer sua libertação, ele pode ir em seu caminho, e ele não dá nada à sua mulher como um dom de libertação. Se o marido não desejar libertar dela e tomar outra esposa, ela deve permanecer como serva na casa do marido.
(looooooooooooool)

Um bocado violentos mas ao menos não matavam os perpetradores de incestos (e isso é bué importante...lol)

Monday, January 25, 2010

Conspiração e pensamento judaico-cristão

Em primeiro lugar devo apresentar a forma como estabeleço os dois tipos de teologia possíveis. A teologia que vem "de cima" e a teologia que vem "de baixo". Não me irei debruçar sobre a lógica dialéctica que permitiria um fluxo constante entre as duas. Não rejeito a ideia do Deus dual de Heráclito. E uma vez que na sua concepção não estava o carácter criador e omnipotente de Deus, não irei entrar em contradição com ele pois irei analisar justamente as concepções que põem o conceito de Deus na transcendência, no exterior da realidade em vez de parte dela.

Podemos-lhe chamar o mesmo Deus, a mesma ideia e conceito mas para quê chamar o mesmo à força criadora e à força coerciva. Só sob o ponto de vista em que o princípio determina a lei da existência e como tal a natureza não-livre. Mas o que me parece mais prático é considerar que tais ideias, a

a)criação/base da existência e o

b)obectivo da criação/sentido da existência

sejam analisados separadamente como conceitos diferentes.

Talvez seja mais preciso dizer que o que difere não são as características de Deus-em-si que separam estes dois conceitos mas antes as duas atitudes que se pode ter perante o mesmo conceito unificado. Por um lado podemos-nos focar na veneração do Deus que assumimos mas, se quisermos, podemos avançar para a dedução que se existe uma força que sustenta o mundo, eu devo descobrir as regras em que ele se sustenta e impor essas regras de conduta que visam respeitar a sua existência. Por fim, posso chegar ao ponto de para além de o venerar, de lhe obedecer e aceitar limitações nos meus actos, deduzir que se ele tem regras que por vezes não são cumpridas, então devo lançar um plano de renovação do mundo que visa chegar ao ponto que ele não seja mais contestado.

É aqui que começa a politização desse Deus. Ao invés de Deus ser procurado para inspiração divina e os sacerdotes tenham como função dar concelhos que sejam pedidos, o desespero e a sede por respostas alimenta de tal maneira o poder dos sacerdotes que agora já não são pedidos concelhos a eles. São eles próprios que enfiam os concelhos à força na cabeça das pessoas. É provavelmente sinal de que os concelhos começavam a falhar e a ser questionáveis.

Onde acho que está o erro?

Ora assumiu-se, no caso do judaísmo que Deus criou o mundo mas que ao mesmo tempo interferiu na sua criação. Que lançou as bases e leis da Natureza mas que logo depois voltou para interferir nas próprias leis que activou. Não será que esse Deus que voltou na verdade, seja outro Deus, outro conceito, outra ideia. Ele disse como tudo funcionava, iniciou a causa efeito e o outro veio dizer que era preciso agir a fazer o que ele mandava. Mas ele já tinha ditado as regras, venham-se elas a saber ou não.

A forma como estas duas componentes do mesmo Deus se podem encaixar e funcionar politicamente é a seguinte.

Temos a visão "de cima":
Desta forma posso utilizar a ideia de Deus para a seguinte visão: "Se Deus existe não sei mas o poder de motivação que advém dessa ideia é tentador" daqui vem a motivação para mandar, alterar condições...

E a de "baixo":
"Se Deus existe, não sei, mas a justificação da existência que advém daí é bastante consolador e reconfortante." daqui vem a motivação para o conformismo, para a predisposição à obediência àqueles que utilizam a visão de "cima"

O facto é que nem todas as culturas se focam na mesma intensidade nas duas componentes e é nestes termos que eu dou destaque aos povos judaico-cristãos que são um caso extremo de aplicação da teologia para o estabelecimento de um plano divino/projecto social.

Primeiro usam-se do Pentateuco para explicar o êxodo e justificar a conquista de Canaã em termos divinos e outros povos mais tarde farão o mesmo para as Cruzadas, nesta altura já com os recursos adicionais do novo testamento.

A verdade é que se encontra em todo o lado, na bíblia, passagens que dão a possibilidade de se fazer um coisa ou o oposto disso. Vai sendo escolhida ao longo dos tempos a interpretação a fazer, as partes que interessam e as partes que não interessam com vista a servir as suas intenções ou apenas a estupidez e vontade de ilusão colectiva.

A coerção nasce da aceitação que se faz da ordem e não da ordem em si. A teoria da conspiração eleva a inteligência do opressor a um tal ponto que imagina que os vícios do sistema político são ditados "de cima" como um Deus-aranha.

Mas o que é preciso acima de tudo é adeptos, aceitação. Não é o simples acto de mentir que controla as massas. É preciso muita gente, demasiada gente com fome ou desesperada a trabalhar para a mentira e nem Hitler nem Stalin trabalhavam sozinhos na fábrica das convicções. Eles não estavam fora do "mundo dos fantoches". A cadeia da obediência não nasce tanto da mentira mas mais de um não interesse pela verdade.

O Deus ex-machina só existe na nossa cabeça e o mesmo se deve dizer dos demónios seus derivados. Até à queda do muro de Berlim era inacreditável a quantidade de comunistas que acreditavam no "master of puppets" capitalista, não a ideia, não apenas no conceito de sistema mas sim, na verdadeira união de uns poucos controladores que ditavam os valores ocidentais. Para se pensar assim basta ir buscar uma informação aqui e ali, colar o que chamava mais à atenção (talvez nem sempre intencionalmente) e da relação entre os eventos escolhidos, retirar daí a constatação de uma força maligna ex-machina tal como na Bíblia, a la Saramago, podemos encontrar passagens a damos mais destaque que a outras e deduzir, se quisermos, que é dos escritos que nasce a força do deus mau que se propaga pelos séculos seguintes. Pouco importa que a própria inquisição tenha começado sem a aprovação do vaticano, que as torturas fossem praticadas por iniciativa dos próprios vizinhos e não pelos superiores da igreja e que a ideia de tais procedimentos seja uma contradição com "não julgueis para não serdes julgados". E até que "eu vim trazer a espada e não a paz" tanto pode ser uma ordem como um aviso. Ignorando certas partes, deduz-se que todo o mal deriva da mensagem primordial, da "letra", pois as traduções, as interpretações, as selecções, os cortes, esses com certeza já trazem consigo a "maldição", o "vírus contagioso" dos escritos originais.

Ainda hoje subsistem estas formas de pensar. Certo pessoal que vai gritar à porta do G27 está mesmo convencido da inteligência dos líderes, do poder prático e efectivo e sobretudo da união entre eles para determinar reacções em cadeia com vista ao controlo. Acham que é só à "plebe" que se mente. Que os poderosos não mentem entre eles. São máquinas perfeitamente polidas e a diplomacia é uma máscara que apenas engana os súbditos. Que máquina perfeita esta. Que espontânea organização tem a vontade de poder. Os jornalistas, esses "vendidos", se no New York Times estiveram os 8 anos contra a admnistração Bush, isso significa, claro, que deve existir uma triagem da informação com vista a manter o desagrado contra Bush mas a não afectar as suas decisões.

Existem de facto, culturas - e a anglo-saxónica é mais flagrante - onde se vê o mundo desta forma. A Rainha de Inglaterra não pôde receber o Sá-Carneiro com a sua ex-que-não-se-queria-divorciar. Era a mensagem, a importância de mensagem que estava em jogo. O perigoso "vírus" que se propaga magicamente pelo povo se ele não tiver o exemplo dos "de cima". Mas dentro desta cultura de controlo da moral, temos os efeitos colaterais, aqueles cidadãos intelectualizados que afectados por esta ideia de "ex machina" vêm o mundo da mesma forma, mas desta vez, sentem-se as vítimas dele. Estão no mesmo esquema, têm o bicho mágico-cristão a corroer-lhes a psique mas vêm-se do outro lado do esquema. A serem controlados pelos fios que os poderosos puxam. É tudo tão simples, é só virarmo-nos contra os que têm o poder, cortar os fios e tudo correrá melhor pois a verdade e a transparência do sistema é manipulada por eles. Para se deslindar conspirações na cabeça ou planos que visem manipulação de massas é preciso inteligência. O mesmo tipo de inteligência que se usa para resolver charadas. Mas o mundo não é uma charada.

Para se ver, por exemplo, a versatilidade dos argumentos que se apoiam na Bíblia para uso político, comparemos a América do Norte com a América do Sul.

Exemplo de Hugo Chavez:

http://www.reuters.com/article/worldNews/idUSN1819661120070519


É espectacular ver como de um lado,a religião cristã é usada para justificar o conservadorismo e noutro lado é usada para inspirar o progressismo. Do lado dos progressistas varia bastante os que admitem e os que não admitem a sua herança. A verdade é que o novo-testamento e as seitas proto-cristãs podem ser tudo, tudo, tudo, menos conservadores. É uma autêntica revolução adolescente alucinada de uma busca de justiça extrema e também irreal que se tratou de tentar direccionar a partir de São Paulo.

Mas quanto ao uso dos argumentos religiosos, defender os pobres tanto pode querer dizer que devemos protegê-los (estado social) como também pode ser usado para os manter pobres (não é preciso estado social, dos pobres trata a igreja).

Que o dinheiro move montanhas é certo. Daí a concluir que a pequena-burguesia, dominante em volume nos países ocidentais, mudaria os seus valores conforme se lhes despertasse para a realidade do sistema é uma conclusão no mínimo, generosa. Mas é nisso que acredita um herdeiro da moral cristã. A única "evolução" que foi feita no ocidente pelos novos moralistas é que agora já não precisamos de nos sentir culpados por querermos coisas. Agora basta atribuir a culpa àqueles que têm poder para as ter, mantendo-nos longe deles para não sermos contagiados com a sua "culpa"...

"O que é a moral judaica? O que é a moral cristã? É o acaso despojado da sua inocência; o infortúnio conspurcado com a noção de pecado; o bem-estar transformado em perigo, em tentação; a indisposição fisiológica envenenada com o verme da consciência."

"...é a invenção de uma forma de existência ainda mais irreal do que a determinada pela organização de uma Igreja. O cristianismo nega a Igreja."

Anticristo, Nietzsche

Nietzsche também diz que o Cristianismo é o passo lógico a seguir ao Judaísmo no caminho rumo à desvitalização, à anti-naturalidade e à cultura do pecado e redenção.
É levar a sublimação dos valores até ás últimas consequências.

A solução final de tal sublimação seria uma espécie de anarco-cristianismo com cristo esquecido. O desaparecimento total de todas as representações materiais da religião e a vitória total da conduta moral incorporada (talvez resultasse em algo de bom mas só se o mundo fosse habitado maioritariamente por clones do Tolstoi).

Reconhece-se este espírito agora com os movimentos anti-globalização, meros efeitos colaterais do capitalismo. O que interessa a estes neo-cristãos encapuçados é saber de quem é a "culpa", essa necessidade abraâmica. E a culpa está naquele concílio de Deuses pagãos infiés ao Deus-bem-liberdade. Quanto mais se abafa Deus (ou seja, a necessidade dele), mais ele se torna estúpido e descontextualizado. Deus anda agora perdido nas ruas a tentar perceber por que nome lhe chamam agora...ele suspeita que é dinheiro o seu novo nome, mas tem vergonha de admitir...é que se calhar sempre foi...


Mas também eu estarei a ser de certa forma ingénuo. Essa visão mecanicista com princípio activo não terá sido "inventada" com a descrição da Criação Bíblica. Tal como não acredito que esse Deus tenha criado o mundo, também não acredito que a visão dessa criação seja ela mesma, uma criação "pura" - não há criações "puras" - mas antes o resultado da ilusão activada pelo despertar de consciência humano. Antes uma adaptação da condição humana necessitada/viciada em explicar a realidade que não existe para ser explicada mas, quanto muito e talvez, compreendida, o que é completamente diferente.

Sunday, January 24, 2010

Vontade

"Os filósofos gostam de falar da vontade como se fosse a melhor coisa conhecida do mundo. Schopenhauer deu a entender inclusive que a vontade é algo que realmente distinguimos, algo perfeitamente reconhecido, sem demasia e sem falta, mas parece-me que Schopenhauer, neste como em outros casos seguiu a mesma rota que todos os filósofos: adoptou e exagerou ao máximo um . preconceito popular. A vontade se me apresenta antes de mais nada, como algo complexo, algo que não possui outra unidade que seu nome e nesta unicidade de nome é precisamente onde encontra seu fundamento o preconceito que enganou a prudência sempre muito deficiente dos filósofos. Sejamos, pois, mais discretos, menos filósofos e admitamos que em cada vontade existe, antes de mais nada uma infinidade de sentimentos: o do estado do qual se quer sair, o do estado ao qual se tende, a sensação destas duas direcções, ou seja "daqui" — "até lá"; enfim, uma sensação muscular que, sem chegar a pôr em movimento braços e pernas, toma parte dele assim que nos dispomos a "querer". Do mesmo modo que o sentir, um sentir multíplice, é evidente que um dos componentes da vontade, contém também um "pensar", em todo ato voluntário há um pensamento director e portanto, deve-se evitar a crença que se pode afastar esse pensamento do “querer” para obter um precipitado que continuaria sendo vontade. Em terceiro lugar a vontade não é apenas um conjunto de sensações e pensamentos, mas também e antes de tudo um estado afetivo, a emoção derivada do mando, do poderio. O que se chama "livre arbítrio" é essencialmente o sentimento de superioridade que se sente ante um subalterno. "Eu sou livre, ele deve obedecer", eis o que há no fundo de toda vontade, a certeza íntima que constitui o estado de ânimo de quem manda. Querer significa ordenar a algo em si mesmo que obedece ou, pelo menos, é considerado como obediente. Mas observemos agora a própria essência da vontade, essa coisa tão complexa para a qual o vulgo usa apenas uma palavra. Se fôssemos a um só tempo, aquele que manda e o que obedece, sentiríamos ao obedecer a impressão de que estávamos sendo obrigados, pressionados e simultaneamente impulsionados a resistir ao movimento, impressões que sequem imediatamente ao ato da volição; porém na medida em que, por outro lado, temos o costume de não fazer caso dessa ambivalência, de enganar-nos a seu respeito graças ao conceito sintético do eu", toda uma cadeia de conclusões errôneas e conseqüentemente, de falsas apreciações da vontade também se ligam ao querer. Como quem acredita de boa fé que basta querer para atuar, assim, na maioria dos casos, alguém se contentou em querer e como também se deve esperar o efeito da ordem, isto é, a obediência, o cumprimento do ato prescrito, a aparência se traduz pelo sentimento de que o ato deveria se produzir necessariamente. Em outras palavras, aquele que quer, acredita que querer e fazer se resumem numa única coisa. Para ele o êxito e a execução do querer são efeitos do próprio querer e esta crença torna mais forte o sentimento de poder, que ele sente, e que o êxito traz como companheiro. O "livre arbítrio": esta é a designação desse complexo estado de prazer do homem que quer, que manda, e que, ao mesmo tempo, se confunde com o que executa, gozando assim o prazer de superar obstáculos com a idéia de que é sua própria vontade que triunfa sobre as resistências. Assim pois, o ato voluntário soma, deste modo, ao prazer de dar uma ordem, o prazer do instrumento que o executa com êxito; à vontade são acrescentadas vontades "subalternas", almas subalternas e dóceis, pois nosso corpo não é mais que a habitação de muitas almas. L'effet c'est moi: acontece aqui o mesmo que em toda coletividade feliz e bem organizada; a classe dirigente se apropria dos êxitos da coletividade. Em todo querer se trata simplesmente de mandar e de obedecer dentro de uma estrutura coletiva complexa, constituída, como já disse, por "muitas almas". Portanto o filósofo deveria considerar o querer a partir do ângulo da moral, a moral como conceito de uma ciência dominante. Donde brota o fenômeno da vida."

Para Além do Bem e do Mal, Nietzsche