Monday, March 12, 2007

Medo da superação=Medo do Futuro=Medo da Solidão

Ao passear por vários blogs que não interessa nomear, verifiquei um padrão interessante na forma de expressão e debate de ideias, presente em todos os blogs.Essas ideias consistiam na identificação de falhas e problemas na sociedade e política ou meramente comentários efémeros, traduzíveis por "boa tarde.como tem passado?".Mas no caso dos posts críticos, nenhum deles apontava para uma solução.Não era possível vislumbrar uma luz.Só restava ao leitor(eu, neste caso) três hipóteses: 1-afundar-se nas suas próprias lágrimas de depressão, 2-nadar na exibição da individualidade do escritor ou 3-subir ao barco e ir embora.

Em todos eles existia apenas um desabafo muito elaborado, mas nem por isso, claro em ordem de ideias.

Não querendo assumir-me mais esclarecido(pois também passo pelos mesmos erros) nem armar-me em psicólogo social, avancei contudo, com uma possível interpretação psicanalítica: a todos os bloguistas que me refiro, parecia ser comum um "medo da mudança" efectiva e não apenas, aparente. Como se tivessem criado um apego aos problemas que mencionavam (ou mesmo dependência afectiva)e ao falar deles, não procurassem, de facto, saídas mas apenas, corredores circulares onde pudessem vaguear e encontrar de novo os seus velhos amigos com os quais se poderão embrulhar noutros termos que foram aprendendo.
Corredores esses, onde certas pessoas poderão, sempre que quiserem, viajar(a bordo de tàxis de lisboa, onde o condutor informa que "isto está tudo lixado") e cruzar-se novamente com as velhas questões por resolver que, apesar de tudo,se tornaram parte da sua vida e sem as quais, sentem um vazio, ficando no ar a suspeita que depois de resolvidas, nada mais haveria para divagar e isso não pode acontecer.
O melhor exemplo deste processo é o descrito no post "a vítima habituada" onde "hàbito" é sem dúvida, a palavra chave.Parece haver um certo prazer escondido em manter questões por resolver, para poder continuar à deriva nelas, demonstrando-se isto, por exemplo, em alguém que diz:"os políticos são todos uns corruptos" e não pensa numa forma de superar esse facto ou sequer, mais maquiavelicamente, usar essa tendência em seu favor.

Penso que esta maneira de ser deve-se a um medo que, embora encoberto, funciona.Eu posso até ser uma vítima dele, sem saber...esse medo de que falo é o de nos imaginarmos num mundo diferente do nosso.Diferente daquele que aconteceu.O medo de um mundo com o qual ainda não estabelecemos nenhuma ligação afectiva e do qual ainda não temos memórias para nos apegarmos. Medo de um mundo que perdesse muita coisa do mal que nos unia e nos obrigava a confortarmo-nos diáriamente em desabafos dos quais começámos a gostar e a não nos imaginarmos sem eles.Um medo que reprime o desejo de liberdade do passado, pois o futuro, estando sempre em construção, não existe e portanto, nada nem ninguém nos garante que, arranjando uma forma mais eficiente de ultrapassar problemas, não se iria ficar sem assuntos que nos ligassem.Arriscamo-nos a querer apenas orientarmo-nos e definir direcções nas ruas e nos mapas e nunca, na nossa mente.

É, realmente, preciso força e coragem para nos abtstrairmos do mundo em que vivemos(objectivamente e não substituindo por fantasias) e tentar imaginar uma saída real dos problemas actuais, fìsicos e metafìsicos, sabendo que com isso poderemos encontrar uma despedida amargurada da realidade na qual a nossa vida se construiu e deu significado aos nossos sentimentos.
É preciso enfrentar a solidão e o medo de cortar ligações devido a ter encontrado um caminho que não vai de encontro aos hábitos e apegos das relações familiares e sociais, pois não devemos achar que o verdadeiro amor ou amizade se esvai por alterarmos as condições e circunstâncias da nossa vida.

6 comments:

PuLhA said...

Penso que o ponto em questão é interessante, mas de outra possível interpretação, mais vasta e mais geral. Penso o fenómeno evidenciado é uma realidade. Especialmente num país que na minha opinião é dado á crítica fácil.
Penso que neste país todos, culturalmente, estamos habituados a criticar pela destructiva tudo e todos. Porque essa é a mais segura e fácil critica que existe.É uma crítica sem risco de nos humilharmos, pois se estivermos errados, nada correu que evidencie algo de mau. enquanto que criticar positivamente implica um risco muito grande, pois se estivermos enganados algo de negativo evidencia imediatamente a nossa opinião naquela catastrofe.
O que obriga aquele que critica construtivamente, a ter muito cuidado e certeza no que diz. Ou seja conhecimentos de causa ao falar, o que criaria uma liquidação dos argumentos e dos egos de todos os comentadores de bancada, e especialmente todos os comentadores profissionais portugueses... (E ELES SAO MUUUUITOS!!).
Mas esta critica e observação do que está "mal" é o maior expoente daquilo que estamos preparados para fazer. Por varias razoes.
Primeiro porque penso que socialmente estamos cada vez mais habituados a nada fazer, e a reeinvidicar tudo de todos menos de nós. Cada vez mais "mimados" somos e cada vez menos se tem a nocao que aquilo que "queremos" nao e importante.
Tambem porque tentar fazer algo sobre isso seria criar uma perspectiva positiva sobre um assunto, que poderia nao funcionar. E esse riso, e um risco que nao estamos dispostos a correr.
Mas acima de tudo, porque se mudassemos o que estava mal, perderiamos a nossa maior actividade... a critica!!

PS (tal e qual como estou a fazer Lolada)

garibaldov said...

A descer todos os santos ajudam...

Anonymous said...

A identificação da existência do medo intelectualmente não é suficiente para a sua superação. Dir-te-ei porque não concordo com o que escreves: porque colocas um problema que não faz sentido se não trouxer consigo uma alternativa de solução. Sobretudo quando identificas nos outros o que fazes no teu blog. Que me interessa a mim as ideias de superação do medo se são limitadas na esperança que os outros se possam iluminar. Mas do quê? O medo não está na perda das ligações ao mal do mundo que nos une. Tão pouco acho que as pessoas sintam alguma espécie de ligação afectiva ou de prazer habituístico quando trocam com o taxista comentários do tipo que pronunciaste: “os políticos são uns corruptos”. Na minha opinião quando se diz isso a um taxista é exactamente a mesma coisa do que dizer “Hoje está muito mais calor?” ou então:“ lá ganhou o Benfica hem!”.

As pessoas sentem medo realmente, por vezes demasiado. Faz parte. Mas não acho que as pessoas sintam medo de um mundo com o qual ainda não estabeleceram ligações afectivas, ou que daí provenha um vazio, (que já existe), pelo contrário é do presente e de coisas bem concretas. No futuro reside a esperança, que dificilmente se perde, de uma vida melhor. Até porque, dá-me um exemplo de uma pessoa que não faça aquilo que quer? Eu dou-te: os sonâmbulos os presos, talvez alguns doentes mentais (é discutível), ou estados pontuais de inconsciência. Porque não podes materializar intenções. De facto a existência não pode ser derivada do pensamento.

Por outro lado a ligação ao mal é um desejo que penso que existe porque encerra o que a maior parte de nós não tem coragem para fazer. Até porque a maioria das acções que praticamos são boas e não más. Eu conduzo o meu carro daqui até ao Alentejo e quando lá chego não me felicito a mim própria nem ninguém me dá os parabéns porque eu consegui não ter nenhum acidente. Parte-se do princípio que conduzir não significa ir contra as paredes. Ainda que possa acontecer, mas que significará, que o bem é a regra e o mal é a excepção. Caso contrário, não resistiríamos nesta vida, hipoteticamente, durante tanto tempo.

E qual é a solução que eu proponho? A força e a coragem que falas são o motor da mudança, sem dúvida. Mas a questão é: Como se conquista essa força e essa coragem? È deitadinhos na nossa cama e de manhã acordamos e decidimos: “Hoje vou ter força e coragem para mudar?” Achas que surge por obra e graça do Espírito Santo? Infelizmente a santíssima trindade não me parece muito interessada na mudança. É aqui, que seguimos caminhos diferentes. Tu fazes o que escreves, ou seja envolves-te na tua própria teia de pensamentos e rodilhos intelectuais cansativos - como diziam os neoclássicos Inutilia Truncat - eu proponho a partilha. E aqui a partilha ousa ir mais longe que as ideias. Senão também eu entrava por esse caminho de piruetas mentais, apego aos problemas e corredores circulares onde pudessem vaguear. Dar e receber. Renunciar ao não, quando ele provém da preguiça, ousar nas escolhas, disponibilizarmo-nos para os sonhos e para as pessoas, reagir ao que acontece, não tomar a superficialidade como um estilo de vida, não ficar fechado dentro de uma caixa convencido que se conhece o mundo todo só porque se tem a sua ilusão através da net, ter um projecto e não desistir dele. Exemplos, onde eu acho que se pode ir encontrar força e coragem para superar medos. Exemplos concretos e não analises psicanalíticas.

garibaldov said...

"no futuro reside a esperança"

É nesse conforto que muita gente vive.É nesse "amanha que canta" e não "o hoje"...

Quando falo de força e coragem, falo de algo que toda a gente tem mas que simplesmente não usa.Não falo de nada que seja preciso conquistar, mas mesmo assim, assumindo que ela não está em todos, se me perguntas como se conquistará essa força e coragem, a resposta é simples: como em tudo, querendo e começando.

Uma maneira de começar é, por exemplo, provocando as pessoas e ver quem responde e neste caso, tu respondeste...

Só o facto de se perder mais tempo a discutir este assunto em vez de a ver a novela, já é um começo, também (não me lembrei de outro exemplo, peço desculpa).

Dizes que identificar um medo não chega.Pois claro que não chega, mas também já é um começo, mais um vez.Pois ao admitir um medo podes começar a lidar com ele, superá-lo e até usá-lo.E se por causa deste post ou deste comentário alguém sentir algum medo do que foi dito, tem duas reacções possíveis:a mais escolhida que é fugir e tentar esquecer o que leu ou então tentar reagir e nesse caso o medo é usado de uma forma positiva.

Tu propões a partilha...o que pensas que se faz aqui?Viste alguém dizer aqui para cada um escrever como se os outros não existissem?Viste-me pedir que assumissem que eu era autista e que quem aqui viesse também se comportasse como tal?O que se faz aqui é exactamente a partilha de ideias e experiências, uma vez que estas influenciaram as ideias de cada um.
Mas a nossa força e coragem não se vai buscar aí, como sugeres(isto resume o teu ultimo parágrafo).Ou se têm ou não se têm.

Quanto à alternativa de solução que reivindicas, embora o objectivo do post não seja arranjá-la, mas sim, lançar esse desafio para nos comentários surgirem frutos, deixo no fim do post, uma ideia que é a de que talvez as ligações que se tem medo de quebrar não sejam tão importantes e que aquelas que são realmente relevantes e não fúteis, revelar-se-ão na vida de uma pessoa quando ela se tornar igual a si própria e vir que ligações resistiram a essa iniciativa.
Não penses, por favor, que assumo alguma espécie de autoridade ou que atingi o nirvana.Apenas faço uma aposta que consiste em que quanto mais verdadeiro me torno, melhor descubro o que é mais e menos importante para mim.

Mas mais uma vez, o meu objectivo é lançar um tema e a minha opinião.É levantar uma questão.E não, livrar-me dela, como tentas fazer, reduzindo-te a "exemplos concretos".Não é também, como se calhar possas pensar, vender nenhum "peixe".Se vendo algum peixe aqui, é que cada um pesque o seu...

"Exemplos, onde eu acho que se pode ir encontrar força e coragem para superar medos. Exemplos concretos e não analises psicanalíticas"

Queres exemplos concretos para ti?Queres que seja eu a fechar-te a mente?

Isso compete-te a ti.Isto não é nenhum "manual para ter sucesso" ao estilo empresário americano.

Anonymous said...

Lançado que foi o desafio de nos aproximarmos de uma ideia sobre nós próprios enquanto criticos, constantes e sempre disponíveis para o efeito, parece-me importante participar no debate.

Qual ferida aberta que mal exposta a uma pequena lufada de ar, nos faz sentir, não só a dor que nos perturba mas inclusivamente, a sua própria existência. Dotados de uma razão que nos confunde os sentidos e condiciona a nossa imagem e a do mundo, somos portadores de opiniões revaladoras de nós próprios. Esse é no fundo o início e o fim da questão.

Iniciamos através das nossa experiências, valorações familiares e sociais onde nos inserimos e no fundo em tudo aquilo que nos caracteriza, a construção de sujeitos individuais e únicos que somos. Este é o ponto de partida para a formação da singularidade. Nem todos olhamos para o Céu e vemos o mesmo... Por tudo isto, somos desde logo provocados pela nossa consciência que nos vai toldando vontades e conceitos e sonhos e até convicções daquilo que se passa à nossa volta. Através dela podemos definir o que pensamos do resto para além de nós.
Assim sendo, cruzamo-nos com multiplos universos singulares, com as suas legítimas e devidas opiniões singulares que muitas vezes colidem com as as nossas. A atitude desafiadora de cada um, por mais altruísta que possa parecer, mais não é que a tentativa e bem sucedida forma de respeito e compreensão das demais perspectivas singulares que com a nossa possam colidir.
A base para a crítica na maioria dos casos, sem que ela possa ter como objectivo o olhar individual do criticado, acaba por se revelar uma reacção de angustias e medos interiores que na verdade foram (brilhantemente) apresentados mas...não é a nossa! Pois é esse é o problema basilar: o tamanho do nosso ego! Tudo o que com ele colide ou provoca é tratado com uma certa forma de desdém, de reserva, no fundo de medo. Somos e sempre seremos para nós o resultado daquilo que de melhor e mais aproximado com a "nossa" perfeição podemos alcançar. Esta é a nossa ferida.
Porém, no fim, somos e seremos apenas o que guardamos nessa individualidade que é total e inequivocamente nossa. Não adianta querer ser ou definirmos o que julgamos que somos, uma vez que seremos sempre ultrapassados por aquilo que de facto e na verdade somos. Trata-se da assumpção e um conceito a que chamamos de maturidade que nos permite elevar esse nível singular em que vivemos para com tranquilidade e respeito considerarmos os demais universos que com a mesma importância que nós se vão cruzando e revelando.

Aproveitemos para,sem complexos ou receios, admirar e quem sabe subscrever os desafios que outros nos podem apresentar.Sem dramas ou medos. Dificilmente deixaremos de ser nós próprios.

Mais, para que o medo não seja o papão que nos persegue confundindo-nos com receio da realidade, que seja ele o impulsionador da diferença, e nessa medida da eventual novidade que contribui para nos fazer anvaçar para outro nível de percepção e construção do real.

Com dignidade e com prudência, mas fundamentalmente, com respeito.

garibaldov said...

O ponto que focas, o da singularidade do indivíduo, serve para me lembrar que não explicitei suficientemente bem a questão da solidão.

De facto, ao tolerarmos a existência de outros universos e aceitarmos as nossas diferenças como aquilo que permite a originalidade do indivíduo, estamos a abrir as portas à descoberta da nossa solidão.Estamos a correr o risco de descobrir algo em nós que não nos liga aos outros. Deparamo-nos com o medo de sermos nós mesmos.É, portanto, preciso saber lidar com a nossa solidão, caso ela nos atinja.

A solução para isto não deve ser, pura e simplesmente, aceitar a legitimidade da opinião de todos mas sim, aceitar a legitimidade do direito do indivíduo de pensar por si próprio sem achar que com isso, estará a ameaçar a legitimidade do próximo.

Compreender o que o outro quer dizer, sem tentar defender-se de uma hipotética intenção ou maneira de ver o mundo que nunca estará totalmente explícita naquilo que é dito.

"Na solidão o homem é a sua verdade – na sociedade tende a ser sua mera convencionalidade ou falsificação. Na realidade autêntica do viver humano, está incluído o dever da frequente retirada para o fundo solitário de si mesmo."

José Ortega y Gasset

Vivemos numa constante fuga da solidão, e logo numa constante fuga de nós mesmos e da nossa realidade.